quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

VINTE E NOVE

      Dizem que Saturno leva vinte e nove anos para percorrer sua própria órbita e voltar ao ponto exato em que se encontrava no dia do nascimento de qualquer pessoa. O Retorno de Saturno. Teoricamente, significaria o início de uma nova fase na vida, quando o indivíduo teria as rédeas do seu destino nas mãos, se desligaria do passado e construiria seu futuro.
        Mas será que essa regra vale para mim também?
     Nasci no dia 29 de fevereiro de 1976 (se tudo der certo, hoje será a nona vez que comemoro meu aniversário). Ainda não descobri nenhuma vantagem em nascer em um ano bissexto, ser  múltiplo do número 4 só faz aumentar minha solidão. Não tenho nada em minhas mãos, muito menos as rédeas do meu destino. Vivo preso ao passado e pouco espero do futuro. Se Saturno passou por mim, esqueceu de dizer um olá.
       Talvez ele tenha deixado para passar por mim em 2092, no meu 29º aniversário, embora eu acredite que não viverei tanto para saber.
        Às vezes eu acho que tenho realmente nove anos. 


Livremente inspirado na canção
"Vinte e Nove" (Renato Russo, 1993) 

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

PODERIAM SER CRÔNICAS, MAS SÃO APENAS NOTAS

(*) Tenho várias restrições quanto às redes sociais, mas não posso permanecer indiferente, nem deixar de considerar admirável, o número de casais que vejo se formando, principalmente através dos blogues. Almas absolutamente parecidas, separadas por inúteis fronteiras, se encontrando nessas intersecções do acaso.

(*) Há quem diga que é do tempo em que se amarrava cachorro com linguiça, não sou tão velho assim, mas com toda essa febre em torno das tecnologias móveis, descobri que sou do tempo em que se ficava em casa porque estava esperando uma ligação.

(*) Gosto do ambiente da cozinha, me traz uma lembrança familiar que nunca abandonei. Mais do que cozinhar, gosto de inventar. De misturar, de encontrar sabores, de nomear pratos com títulos poéticos. Questionado sobre o que não pode faltar na minha cozinha, respondi: Heineken.

(*) Não costumo me manifestar quando o assunto é carnaval. Não entendo, não sei como funciona, não participo. Carnaval, para mim, é sinônimo de silêncio, de cidade vazia. Melhor escola de samba, bateria nota dez, melhor bloco, melhor cantora, melhor música, revelação... Acho que não faz sentido transformar uma festa popular em competição.

(*) Após oito anos, e inúmeras versões, enfim o meu livro de contos está pronto, do jeito que sempre imaginei. Agora é lutar para encontrar uma forma decente de publicação.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

DE SEGUNDA

        A primeira impressão é a que fica, mas apenas para quem se deixa levar pelo preconceito. Na primeira impressão não conseguimos avançar além das máscaras, das meras formalidades e posturas defensivas, por isso não é incomum nos tornarmos amigos de pessoas que antipatizávamos (ou vice-versa). Primeira impressão é capa de livro, é gata(o) na balada.
    Rever um filme pode ser uma experiência absolutamente satisfatória, saber como os acontecimentos se encaminharão, traçando causas e consequências previamente, sem nos perdermos no labirinto das possibilidades, nos permite enxergar tudo de maneira ampla e tranquila, livre das expectativas e armadilhas do roteiro. O mesmo vale para a literatura, reler um livro é sempre encontrar um livro novo. Não é difícil gostar mais de um livro depois de uma segunda leitura.
        Descobri esse prazer nas reprises dos jogos de futebol nos canais fechados, que me fazem companhia nas madrugadas insones. Acompanhar uma partida conhecendo o seu resultado é, inusitadamente, interessante. Não há tensão, não há torcida, não há ansiedade. Sabendo antecipadamente a conclusão de uma jogada, podemos analisar objetivamente, sem o coração nas mãos – embora, algumas vezes, eu vibre mais com os melhores momentos do show do intervalo. Acho que depois disso, comecei a admirar o jogador mais cerebral, aquele que recebe a bola, observa, pondera, e define a jogada num genial passe – de segunda. Parece que quem toca de primeira quer somente fazer a alegria dos narradores e espera contar mais com o acaso do que com a técnica (vide o número de passes errados encobertos por uma vitória).
        Obviamente, também não acredito em amor à primeira vista. O amor, amor pra valer, precisa ser construído, sem clichê de conto de fadas, sem mágica. Dou sempre uma segunda chance ao amor, aos livros, aos filmes, à vida. A única exceção talvez seja a música, mas isso renderia uma outra crônica.        
   

sábado, 4 de fevereiro de 2012

A INFÂNCIA DOS IRMÃOS DARDENNE

Longe das benesses prometidas pela globalização, os irmãos belgas Luc e Jean-Pierre Dardenne inserem em seus filmes severas críticas ao tratamento oferecido para quem procura melhorias fora dos seus países de origem, sendo a imigração ilegal o tema central de dois trabalhos. Somam-se a isso, desempregados, indivíduos de baixa renda, moradores da região periférica e outros seres desesperançados que irão ajudar a compor o quadro de uma sociedade europeia menos privilegiada, principalmente a partir de 1996, com o ótimo e despretensioso “A Promessa”, filme que já trazia as principais peculiaridades do cinema deles: o uso de locações e luz natural, a ausência de maquiagem e trilha sonora, a câmera na mão, muito próxima dos atores, enredo que não possui necessariamente um começo ou um fim e temática social – elementos herdados do passado como documentaristas. No entanto, são os jovens marginalizados e crianças que tiveram a infância abortada que serão a essência da sua breve obra até agora. 
[LEIA O ENSAIO COMPLETO AQUI]


FILMOGRAFIA: LONGA-METRAGEM DE FICÇÃO

2011 O Garoto da Bicicleta (Le Gamin au vélo)
2008 O Silêncio de Lorna (Le Silence de Lorna)
2007 Cada Um com Seu Cinema (Episódio: Dans L’obscurité)
2005 A Criança (L’enfant)
2002 O Filho (Le Fils)
1999 Rosetta
1996 A Promessa (La Promesse)
1992 Je Pense a Vous (inédito no Brasil)
1987 Falsch (inédito no Brasil)

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

O DIA DA MARMOTA

            Hoje é o Dia da Marmota. Hoje também é dia de festa no mar e dia de Nossa Senhora da Purificação, padroeira do meu torrão natal, mas o Dia da Marmota é mais importante.
       Segundo a tradição de uma pequena cidade estadunidense, na manhã de dois de fevereiro as pessoas devem observar uma toca de marmota, caso o animal saia da toca com o tempo nublado, isso indica que o inverno terminará cedo, mas se o dia estiver ensolarado e o animal se assustar com a própria sombra e retornar para a toca, é sinal de que o inverno durará mais seis semanas. A marmota que todos os anos anuncia a duração do inverno, dizem,  possui mais de cem anos, e é cuidadosamente protegida por um grupo de cidadãos locais desde 1887. Este evento célebre, para a  incredulidade de muitos, atrai milhares de turistas todos os anos.
       No filme FEITIÇO DO TEMPO, Bill Murray é o repórter que anuncia as previsões metereológicas em um canal de TV, e para sua contrariedade é encarregado de fazer uma matéria sobre a marmota. No entanto, ele desperta sempre no mesmo dia e é obrigado a vivenciar tudo novamente. Cínico e intolerante com todos ao seu redor, ele encontra nessa “condenação” uma forma de se redimir, sendo, ao final, uma alegoria sobre a humanidade nesses tempos onde os dias parecem caminhar cada vez mais rapidamente, todos sempre apressados, onde acreditamos viver uma imensa rotina, quando na verdade a culpa dessa rotina é apenas nossa.
        Também queria acordar no mesmo dia e viver o meu dia igual de maneira diferente. Queria cometer outros erros, ter outras dúvidas e temores. Mas acho que estou cada vez mais parecido com a marmota e me assustando com a minha própria sombra. Melhor voltar para a toca e ver se “Feitiço do Tempo” já está passando em algum canal.
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