sábado, 31 de maio de 2008

CIDADE E RIO – ROBERTO MENDES


“Roberto Mendes, certamente um músico fora do comum, extraordinário, apegado e apaixonado pela sua gente, sua terra, sua água tão limpa e única, e tão apodrecida hoje com a desculpa do progresso. Progresso miserável matando seus rios, peixes, mariscos... Progresso de chumbo que corrói o solo bendito de tantos canaviais. Ao inferno todos os perversos que iludiram e iludem a “ cidade e o rio”, donos dos sons e sabores que aqui na música única de Roberto sente-se, respira-se e saboreia-se. Uma foto do Brasil real, não o virtual e inútil. Na nossa cara, entrando pelas narinas, poros e goelas o “auxílio luxuoso” dos mestres (Guinga, Lenine, Alcione, Pedro Luís e Marco Pereira) que aqui vieram confirmar o que digo, penso, choro e com que me delicio. A música ainda pode nos salvar de todo o mau. Bravo e obrigada, Roberto!”
Maria Bethânia


Para o homem do Recôncavo Baiano, o rio não é apenas uma via de ligação. É o caminho por onde continuamente passa sua história. Santo Amaro da Purificação e o Subaé simbolizam essa ligação orgânica, em que a água e o homem, com sua obra e sua alma, seguem juntos o mesmo percurso. Cidade e Rio com seus sons característicos das culturas que por elas navegam. A chula, samba de viola no curso em que a poesia contemporânea de Jorge Portugal, Capinan, Caetano Veloso, Herculano Neto e Nelson Elias se coloca como afluente.

FAIXAS

01 CIDADE E RIO (Roberto Mendes/Jorge Portugal)
02 PURIFICAR O SUBAÉ (Caetano Veloso)
03 MEMÓRIAS DAS ÁGUAS (Roberto Mendes/Jorge Portugal)
04 BEIRA MAR ((Roberto Mendes/Capinan)
05 ESSE SONHO VAI DAR (Roberto Mendes/Jorge Portugal)
06 LINDA MORENA (Roberto Mendes/Nelson Ellias)
07 TIRA ESSA MULHER DA RODA (Roberto Mendes/Capinan)
08 DEU SAUDADE (Roberto Mendes/Herculano Neto)
09 MARAVILHA MARGINAL (Roberto Mendes/Jorge Portugal)
10 POESIA, SAMBA E BAIÃO (Roberto Mendes/Capinan)
11 DEMANDA (Roberto Mendes/Capinan)
12 BOM COMEÇO (Roberto Mendes/Capinan)

Biscoito Fino – 2008

quarta-feira, 21 de maio de 2008

"A GAROTINHA RUIVA"

           Perdido nos corredores de uma infância labiríntica, nos agora longínquos anos da década de 80, entre questionamentos prematuros de uma adolescência apressada e personagens de quadrinhos e TV, eu tentava simplesmente encontrar em algum herói de ficção um espelho. Em algumas ocasiões talvez tenha encontrado: fui um pouco Spaceghost; Demolidor; Ultraman; Lanterna Verde... Enfim, fui tantos na frustrada tentativa de não ser eu. Curiosamente, aquele que mais me marcou não tinha super poderes nem lutava contra forças do mal em defesa do nosso planeta. Na verdade ele era bem simples. Bem tímido. Bem fracassado. Bem eu.
            Charlie Brown, por vários anos, foi o exemplo de amizade que desejei para mim, sem achar. Procurava visualizar entre os meus colegas, na escola ou na rua, alguém como ele. Solidário, afável, sensível... Sua turma era minha turma, seus medos eram os meus medos, sua total inabilidade com as atividades infantis também era minha. A idealização do primeiro amor como um sentimento inatingível foi o ponto mais em comum dessa fase. Charlie Brown e eu sofríamos com as desventuras de relacionamentos apenas fantasiados. (Entre as cores da imaginação e o cinza da realidade, pouco sobrava de nós). A garotinha ruiva deve ter sido a nossa maior identificação: uma garota sem nome, traduzida somente pela cor dos seus cabelos, um amor completamente idílico. Temendo não ser aceito ele não se apresentou à garotinha ruiva, e em seu lugar foi seu melhor amigo, Linus - que a beijou, se apaixonou e quebrou a magia ao descobrir seu verdadeiro nome. Charlie Brown amargou mais uma derrota com a resignação de quem se acostumou a não vencer. Não me lembro bem, mas acho que era inverno. Muitas estórias passavam-se no inverno. No inverno é tudo mais triste. (Jamais toquei a neve).
            A minha garotinha ruiva não era ruiva; ainda hoje seus cabelos negros visitam minhas lembranças pueris. Nunca mais a encontrei, nem pretendo encontrá-la. Não posso furtar do que me resta de inocência essa recordação doce. É possível até que eu tenha passado por ela em uma avenida qualquer, esbarrado e pedido desculpas no supermercado ou sentado ao seu lado no ônibus ou num banco de praça sem tê-la reconhecido. Melhor assim.
Hoje, olhando para trás, não vejo aquele menino introvertido em mim. Tudo parece distante e inacreditável, quase paralelo. Talvez por ter vivido a perda com tanta intensidade eu tenha decidido na prática o que não queria ser.
           Nunca perdoei Linus por ter beijado a garotinha ruiva. Nunca perdoei Charlie Brown por ter perdoado Linus. Nunca me perdoei por não ter perdoado os dois.


Herculano Neto

sexta-feira, 16 de maio de 2008

SANTO AMARO DA PURIFICAÇÃO (BA) – 1933


AUTORRETRATO TERCEIRIZADO

Herculano Neto é poeta, ficcionista, roteirista de filmes inacabados, blogueiro, letrista de música popular, cineclubista... Teme ser comparado ao pato (que nada, caminha e voa, mas faz as três coisas muito mal). Desconforta a alcunha de poeta, porém tem aprendido a conviver com ela – só não gosta quando pedem para recitar, parecem os que pedem para o peixe-palhaço contar uma piada em “Procurando Nemo”. Gosta de ser lembrado como o neto do Herculano, talvez por isso fale sempre na terceira pessoa – não se sente, ainda, proprietário do nome. Santamarense que não pede bênção, funcionário público na capital da Bahia, um tímido incorrigível. Adora filmes, fotografias, cultura pop, edições antigas autografadas para desconhecidos, autores de sua geração, quadrinhos e música (em casa tem dificuldade para organizar tanta tralha, é possível que ao desencarnar sua família venda tudo a peso para o sebo de Brandão ou para a Berinjela). Foi publicado e gravado, no entanto possui um espírito inédito – acredita que não foi devidamente explorado. Avesso a modismos tem calafrios ao ouvir a palavra “tendência”. É viciado em solidão, mas não resiste a um abraço. Tem telefone celular porque não tem jeito, às vezes atende as ligações. Perde a razão por causa do Bahia, para o bem e para o mal. Abandonou a Coca-Cola, mas não Campari com soda. Trocou recentemente o Atari que herdou do tio no natal de 1988 por um Supernintendo que o sobrinho abandonou no armário do quarto, porém é comum ser flagrado altas horas jogando Space Invaders.
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