terça-feira, 27 de agosto de 2013

TRÊS

    
          Soube por estranhos, semanas depois, sobre o falecimento. Esbocei meu pesar numa nota de solidariedade, enquanto observava nós três, ainda jovens, no porta-retratos da escrivaninha. Mas não enviei.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

UM MISERÁVEL A VER NAVIOS

Léa Seydoux
Toujours je perds,
Toujours un manque,
Toujours je souffre,
Toujours je suis planté là.

Toujours je démolis,
Toujours j’attends,
Toujours je recommence,
Toujours je reste là, les mains vides

Un misérable quémandant de l’affection, voilà ce que je suis

Herculano Neto
Tradução para o francês: Pedro Vianna




sempre perco
sempre falta
sempre sofro
sempre fico a ver navios

(“sem sentido para o céu
indiferente para o inferno”)*

sempre despedaço
sempre precipito
sempre reinicio
sempre fico com as mãos abanando

miserável esmolando afeto é o que sou


*BERGMAN, Ingmar. O Sétimo Selo. Suécia, 1956. 

 

sábado, 17 de agosto de 2013

THIS CHARMING CHARLIE

É bem provável que a banda preferida do lamentoso Charlie Brown fosse The Smiths, deve ser o que pensou  a graphic designer Lauren LoPrete, quando juntou esses dois ícones da cultura pop no tumblr THIS CHARMING CHARLIE. As letras nada otimistas de Morrissey não poderiam ter encontrado lugar melhor para habitar.
Não tenho certeza do que 'felicidade' significa/ Mas eu olho nos seus olhos
E eu sei que ela não está aí
(JEANE)
Então você vai, e você fica sozinho/ E você vai embora sozinho
E você vai pra casa, e você chora/ E você quer morrer
(HOW SOON IS NOW)
E se você acha que a Paz/ é um objetivo comum
Bem, isso mostra o quão pouco você sabe
(DEATH OF A DISCO DANCER) 
Me chame de mórbido, me chame de pálido/
Eu gastei tempo demais atrás de você
Tempo demais perseguindo seu rabo
(HALF A PERSON)
Eu fumo porque estou esperando uma morte precoce
E eu preciso me agarrar a algo! 
(WHAT SHE SAID)

Talvez eu possa morrer/
Com um sorriso no meu rosto no final das contas
(THAT JOKE ISN'T FUNNY ANYMORE)

terça-feira, 13 de agosto de 2013

“QUERO QUE VOCÊ ME AQUEÇA NESSE INVERNO”

Quero escolher o modelo da lápide e rascunhar o epitáfio da minha sepultura.

Quero reencontrar minha família no quadro dos desaparecidos. 

Quero uma escola com o meu nome, uma praça de Santo Amaro ou o aeroporto de Salvador. 

Quero rechaçar uma biografia não autorizada, virar notícia após um acidente de carro.

Quero faltar à sessão de lançamento das minhas obras completas.

Quero uma casa no campo, uma casinha na varanda, uma casinha de sapê.
    
Quero que minha declaração de amor chegue ao topo dos Trending Topics mundial.

Quero me perder no bosque encantado da Nanda Costa.
    
Quero que o meu filho assine um contrato milionário com o Galatasaray.
    
Quero que o meu canal do Youtube seja considerado a salvação do humor nacional.
    
Quero processar Arnaldo Antunes por plágio.
   
 “Quero seus cabelos negros nas minhas mãos”.
    
Quero negar o affair com uma “celebridade da mídia”, não reconhecer a paternidade de um filho (fruto de um caso com essa mesma “celebridade da mídia”).
    
Quero brigar com o TV Fama, com o Pânico, com Zeca Camargo.
    
Quero que minha patente invada a casa das pessoas.
    
Quero um google doodle.
        
Quero ser feliz.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

MADRI

Sara Montiel
penso naqueles deslizes
na dissimulação
nas cartas na mesa
na virada de mesa

penso na melancolia que me cai em agosto
e num antigo filme
(quase preto & branco)
que assisti numa madrugada em santo amaro

penso
enquanto aguardo os touros na arena

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

BRAVO!

última, e melancólica, capa da BRAVO!
Nunca gostei de ser assinante de revistas, gosto de ir até à banca, perguntar se já chegou, folhear outras publicações, conversar com o jornaleiro, comentar as manchetes dos jornais, a rodada do Brasileirão... Uma das revistas que sempre compro é a BRAVO! (foi uma satisfação especial ter meus contos publicados em suas páginas) e agora me vejo meio órfão com a notícia de que a editora Abril cancelou sua publicação. Os argumentos comerciais da editora até poderiam fazer algum sentido, como o baixo número de anúncios publicitários, a perda de leitores das mídias impressas frente à evolução digital e o baixo número de exemplares vendidos mensalmente (cerca de vinte e oito mil, entre assinantes e compradores espontâneos). Mas um dos títulos mais interessantes da editora fundada por Victor Civita deveria ter sua existência garantida, independentemente da quantidade de anunciantes. A BRAVO! era mais do que isso.

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

ALÉM DO QUE SE VÊ


FISH TANK
(Reino Unido, 2009)
Direção: Andrea Arnold


Mãe solteira com filhos que mais parecem seus irmãos é um cenário cada vez mais comum nesse novo perfil dos núcleos familiares mundo afora. Aqui temos Mia, uma garota de 16 anos que vive com a mãe e a irmã menor em um conjunto habitacional claustrofóbico (o aquário do título?), e que sonha em se tornar dançarina – pessoas desajustadas que precisam encontrar algum sentido para existirem. Se a dura realidade, sem nenhum gesto de afeto ou possibilidades de melhora já seria o bastante para complicar sua vida, tudo piora com a chegada do novo namorado da mãe, o sempre ótimo Michael Fassbender. Mas não se enganem com as aparências: a previsibilidade se resume ao inevitável choque de gerações, apenas. As soluções são, muitas vezes, cruéis, – embora uma doce canção como "California Dreamin'" possa trazer contornos de frágil esperança.

 
NOTA DE RODAPÉ
(Hearat Shulayim, Israel, 2009)
Direção: Joseph Cedar


Premiado como melhor roteiro no Festival de Cannes em 2011, essa comédia israelense possui um humor, no mínimo, inusitado, o que a torna, ao mesmo tempo, divertida e melancólica. Muitas situações lembram os melhores momentos dos irmãos Coen. Pai e filho são dois estudiosos do Talmude, o livro sagrado dos judeus. O pai é um sujeito rancoroso e solitário, que acredita nunca ter obtido o reconhecimento merecido por seu trabalho. O filho, extremamente vaidoso e arrogante, é um bem sucedido pesquisador que vive aparecendo na mídia e recebendo prêmios devido ao grande sucesso dos seus livros, o que evidencia ainda mais a tensão entre os dois. O título do filme se refere a um único exemplo de reconhecimento público do pai, que se orgulha de ter sido citado, como nota de rodapé, em um livro de um celebrado estudioso do Talmude. Não há culpados nem inocentes, somente a hipocrisia e a pequenez do ser humano.
 
AS PALAVRAS
(The Words, EUA, 2012)
Direção: Brian Klugman e Lee Sternthal


Uma plateia atenta aguarda o autor (Dennis Quaid) de um aclamado best-seller para uma leitura pública da sua obra, a partir daí conhecemos a história do aspirante a escritor (Bradley Cooper), que busca, sem sucesso, a publicação do seu primeiro romance. Presenteado pela esposa (Zoe Saldana) com uma antiga valise comprada num antiquário, ele encontra dentro dela os originais de um fascinante livro e acaba assumindo para si a autoria, o que o torna rapidamente em um enorme sucesso. É quando entra em cena seu verdadeiro autor (Jeremy Irons). Realidade e ficção se entrelaçam, como se estivéssemos lendo um livro e não assistindo a um filme. Recebido friamente pela crítica no último ano, por não ter considerado original o mote do escritor sem inspiração que plagia um autor desconhecido, “As Palavras” é um filme que merece ser visto (ou revisto) com mais atenção.

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