quinta-feira, 28 de abril de 2022

SOCIAL DISTANCIAMENTO XVII

Diários da pandemia ou notas perdidas nas páginas ociosas de uma velha agenda

(Abril, 2022)

Voltei a postar no blogue em abril de 2021. Escrever em um blogue novamente, e usando uma linguagem bastante informal, como se fosse realmente um diário ou uma nota perdida numa velha agenda, foi a maneira mais óbvia, e fácil, que o que restou de mim encontrou para tentar sobreviver à pandemia – tão óbvia que frequentemente penso que deveria ter retomado antes, teria me poupado de alguns desastres e tarjas-pretas. Fiquei tanto tempo afastado que ninguém próximo se deu conta que retornei, nem antigos leitores, amigos, familiares, curiosos, haters... ninguém (o que me deixa, inclusive, mais à vontade, saber que haveria alguém na caixa de comentários, às vezes era agradável; noutras, desconfortável). Um ano depois, e pelo número de acessos diários, concluo que não estou sozinho aqui. Provavelmente, náufragos trazidos por alguma conjunção aleatória do buscador.


quarta-feira, 20 de abril de 2022

CONTÉM SPOILER XVI

Aquele filme que eu te falei 

Acredito que todo mundo que se diz (ou dizem que é) cinéfilo, frequentemente é abordado sobre dicas de filmes e séries, preferencialmente “recentes e legais”. Há uma espécie de responsabilidade nessas sugestões, é preciso avaliar o tipo de produto e público para recomendar algo que melhor se adéque ao perfil e não simplesmente prescrever a última produção assistida, a que está mais ativa na memória, ao alcance da mão na gaveta das lembranças. Resumindo: ser mais caloroso e menos impessoal que o  arrogante algoritmo do streaming. Sei que deveria ser natural e não causar surpresa nenhuma, mas em um desses pedidos, me dei conta que estava indicando apenas obras protagonizadas por mulheres. Já citei nesta coluna Penélope Cruz em “Madres Paralelas”, Olivia Colman em “A Filha Perdida” e Kate Winslet na premiadíssima minissérie “Mare of Easttown”; poderia ter escrito também sobre Alana Haim em "Licorice Pizza", Elisabeth Moss em “The Handmaid’s Tale”, Phoebe Waller-Bridge em "Fleabag" ou a norueguesa Renate Reinsve em “A Pior Pessoa do Mundo”  –  para ficar nas que vêm mais fácil à cabeça. Certamente não é mera coincidência ou uma polaroid de um momento, talvez seja uma bem-vinda mudança de paradigma. Longe de príncipes encantados, souvenir de desejo ou interesse romântico do mocinho, vejo cada vez mais atrizes em papéis e interpretações notáveis. E que continue assim. Minha lista de recomendações agradece.


quarta-feira, 13 de abril de 2022

VIRADA DE PÁGINA XIV

Papel jornal, couché, off-set, polén, reciclado, kindle ou pdf

 
Não sou nenhum sommelier de papel, nem pretendo, sequer consigo especificar o tipo ou a gramatura, tudo que me permito afirmar é se o papel é bom ou se não é tão bom, um leigo declarado e sem remorsos. Quem foi catequizado nos formatinhos de papel jornal grampeados numa lombada canoa não pode reclamar da sofisticação atual disponibilizada pelo mercado. Capa dura, sobrecapa, lombada arrendondada, ondulada, verniz localizado, grimório, omnibus, absolute, edição definitiva, corte trilateral, soft touch, fitilho marcador… Ufa, o cardápio é extenso. Mas enquanto as editoras oferecem cada vez mais luxo nesses tais objetos transcendentes, um capa cartão, com preço acessível, já é mais do que suficiente para me fazer feliz. 


terça-feira, 5 de abril de 2022

SOCIAL DISTANCIAMENTO XVI

Diários da pandemia ou notas perdidas nas páginas ociosas de uma velha agenda


(Março, 2022)

Não costumo perguntar por alguém que não vejo há tempos. Sei que é bem mais que uma regra de etiqueta, é um gesto cortês, empático, delicado até; porém, não consigo. Tenho receio de ouvir em troca um “você não soube?” – “você não soube?”, para mim, é o preâmbulo da tragédia. Há quem possa, com todo direito, contra-argumentar que se trata de uma mera questão retórica, uma muleta linguística, que o meu receio, além de paranóico, é banal. “Você não soube?” pode servir para anunciar uma notícia boa, algo como ele recebeu uma proposta de emprego em outra cidade e precisou se mudar, tipo de informação que eu saberia se fosse mais assíduo e curioso em redes sociais, mas continuo achando melhor não arriscar. Por outro lado, “Você não soube?” pode servir, também, para anunciar uma notícia que não saberia interpretar de supetão se é boa ou ruim, algo como “separamos” – o que me deixaria confuso, sem saber se lamento ou felicito. Não me importo que me acusem de deselegante, mal educado, que falem “encontrei Herculano e nem perguntou por você'. Amigo, acredite que eu pensei, ensaiei, esbocei, quase perguntei, no entanto desisti no último momento apenas para não escutar um “você não soube?” e aguardar apreensivamente, durante infinitos milésimos de segundo, por uma resposta que me aliviaria ou me afundaria ainda mais na calçada.

sexta-feira, 1 de abril de 2022

NO TOCA-FITAS DO MEU CARRO XIV

Porque sou o meu próprio Mariozinho Rocha

Acho que faz parte do imaginário de boa parte dos fãs de classic rock ter presenciado o Festival de Woodstock e inalado aqueles dias de flower-power – fascínio absolutamente justificável. No entanto, naquele mesmo verão de 1969, em Nova York, cerca de trezentas mil pessoas acompanharam outro evento. Sem tanta popularidade e praticamente esquecido da história por décadas, o Harlem Cultural Festival, brilhantemente documentado no filme Summer of Soul (...ou, Quando a Revolução Não Pôde Ser Televisionada), muito mais politizado que seu colega afamado, trazia um line-up formado por artistas negros se apresentando para um público majoritariamente negro. Com uma programação que reunia Stevie Wonder, B.B. King, Nina Simone, Mahalia Jackson, Chambers Brothers, Sly & the Family Stone, Chuck Jackson, The 5th Dimension, David Ruffin, Hugh Masakela, Gladys Knight & the Pips, entre outros. Analisando agora, já não sei dizer em qual dos festivais gostaria de ter participado. 


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