segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

MICKEY ROURKE

Sei que a Academia de Hollywood adora premiar filmes sobre superação, redenção, expiação, etc... Talvez por isso, mas não só por isso, acreditei que Mickey Rourke ficaria com a estatueta de melhor ator – o que me deixou dez reais mais pobre devido a uma aposta perdida. Transitando sem excessos entre o real e a ficção, sua interpretação contida em “O Lutador” me convenceu mais do que os trejeitos histriônicos de Sean Pean (apesar de ser um excepcional ator seu Harvey Milk me diz menos do que Heath Ledger em Brokeback Mountain). Para quem cresceu vendo Mickey Rourke nas sessões da madrugada em clássicos instantâneos como “Coração Satânico” e, principalmente, “O Selvagem da Motocicleta” fica difícil manter a indiferença ao vê-lo agora: esquivando-se de um clichê aqui e outro ali e divertindo-se sem culpa ao som de um bom e descompromissado metal farofa. Se ele merecia o Oscar ® ou não pouco importa (fica a discussão apenas para a mesa do bar). E ainda havia a belíssima canção de Bruce Springsteen, “The Wrestler”, que premiada com o Globo de Ouro foi completamente ignorada pela Academia – que adora musicais da Disney e afins.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

BORA BAÊA!

           Time se escolhe.
           Mas a nítida sensação é que eu já nasci tricolor, muitos torcedores dirão igualmente, e não é apenas frase de efeito: é realidade. Se me perguntarem jamais conseguirei determinar exatamente quando passei a torcer – só sei que torcia.
           Na tarde de 19 de fevereiro de 1989, aos dez anos, aguardava ansioso pela transmissão da final do campeonato brasileiro do ano anterior (entre Internacional de Porto Alegre e Bahia da Bahia mesmo). A espera era solitária. Meus amigos e meu irmão eram mais jovens do que eu e da bola só queriam o baba; meu pai, torcedor do Vitória, pertencia ao grupo dos descontentes e naquela tarde, antes de sair pra trabalhar, me incumbiu de colocar a areia que estava na rua desde a manhã passada para o quintal. Deixei a tarefa para ser cumprida após a partida – a construção não tinha pressa.
           Pouco antes de começar o jogo meu tio Rui, rubro negro fanático, chegou discretamente em sua cadeira de rodas e se ajeitou do lado de fora, de onde podia assistir sem incomodar ou ser incomodado – ficou em silêncio e assim foi embora.
           Bahia campeão. A imagem do goleiro Ronaldo agradecendo aos céus e minha mãe desligando a televisão:
           - Vai fazer o que teu pai mandou!
           Ok, manda quem pode e, embora não pareça, nunca me faltou juízo.
           Enquanto carregava um balde caindo aos pedaços, cheio de areia, acompanhava o espocar dos fogos e os gritos de euforia dos torcedores que não paravam de multiplicar. Num momento de distração feri meu punho no alumínio do balde e ainda tive de ouvir de minha mãe alguns impropérios antes dela isolar o ferimento com uma faixa feita de tiras de pano.
            Ainda trago a cicatriz.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

CINE-TEATRO SÃO PEDRO

Inaugurado em 12 de agosto de 1865 em Santo Amaro (BA), e considerado o segundo principal teatro da Bahia, o Teatro São Pedro era uma cópia fiel do Teatro São João, na capital do estado. Situado na Praça do Rosário (onde hoje se encontra o hospital), o São Pedro pertencia a um grupo de intelectuais santamarenses, idealistas que conseguiram arrecadar dezesseis mil réis e ergueu um dos mais belos monumentos arquitetônicos já existentes em Santo Amaro. O Teatro São Pedro tinha 60 palmos de largura por 140 de comprimento, o seu pano de boca representava a alegoria “O Florestamento do Brasil” e seu palco media 44 palmos de fundo por 34 de largura. A platéia continha cerca de 200 cadeiras de palhinha bem cômodas. No primeiro pavimento havia 20 camarotes e no segundo uma bela varanda que acomodava 210 pessoas, além de um grande salão de recreio e um saguão de entrada que tinha de cada lado salas que vendiam lanches e bebidas. Sua iluminação era a gás carbônico. Grandes companhias líricas, dramáticas e operetas se exibiram com sucesso porque satisfaziam as exigências de uma platéia culta e refinada. Após passar por uma enorme reforma o Teatro São Pedro tornou-se Cine-Teatro (novidade absoluta na época) e reabriu suas grandes portas envidraçadas ao público, inaugurando suas novas instalações com o filme “Bombeiros Improvisados” na noite de 02 de outubro de 1910, um domingo. Mas por uma fatalidade, ou cruel ironia, o teatro foi tomado pelas chamas e destruído em poucas horas, transformando seus espectadores em verdadeiros bombeiros improvisados. Desaparecendo, dessa forma, o imponente Teatro São Pedro em uma data trágica para a cultura de Santo Amaro. Nas décadas seguintes, conforme se observa nos antigos periódicos santamarenses, tentou-se sem êxito a restauração do teatro, bem como a construção de uma nova casa de espetáculos na cidade.

TEATRO SÃO JOÃO (SALVADOR)

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

CASA DE TAIPA

Na antiga vila em que meus avós moravam havia um compromisso tácito, um tipo de acordo comunitário, onde todos se ajudavam – uma organização social sonhada por teóricos, mas praticada por indivíduos simples. Na construção das casas de taipa, por exemplo, homens e mulheres tinham funções distintas, enquanto as pessoas mais velhas pisavam o barro entoando cantos, ditando o ritmo do trabalho, as mulheres passavam aos homens os montes de massa para ser socado entre as estacas, tudo regado com muito samba e alegria. Numa época de costumes rígidos e recato a entrega do barro possuía um simbolismo próprio, uma espécie de rito de passagem: para quem a mulher entregasse mais barro era como se ela também se ofertasse, como se ela dissesse que estava pronta, era um momento disputado, quando ela escolhia seu parceiro. Meus avós, que cresceram juntos, decidiram que seriam um do outro na construção da casa de uma tia-avó que não conheci, surpreendendo muitos.
Vivi meus primeiros anos numa casa de taipa bem pequena, embora sempre a recordo maior do que foi. Da parede perto da minha cama, certa feita, caiu um pouco de barro e surgiu uma fenda, que se transformou num buraco – era a minha janela. Do buraco observava o terreno baldio onde brincavam os cães. Numa manhã chuvosa, improvisando com plástico preto, meu pai fechou o buraco. Não há um único dia, ao apertar o número 6 do elevador, que eu não lembre da casinha de taipa e da janela dos cães.
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