segunda-feira, 30 de julho de 2012

ALÉM DO QUE SE VÊ III

PRIMER (EUA, 2004)
Direção: Shane Carruth

Com apenas, inacreditáveis, sete mil dólares, um matemático desencantado com a profissão decidiu escrever, dirigir, atuar, compor a trilha sonora, escalar um elenco amador, usar a própria garagem como estúdio de filmagem, editar em um computador caseiro, e mesmo sem utilizar nenhum efeito especial, acabou realizando uma das melhores ficções científicas da história do cinema, e a melhor no sub-gênero “viagem no tempo”, sem dúvidas.  Com um roteiro que consegue tratar da maneira inteligente os paradoxos temporais, o calcanhar de Aquiles desse tipo de produção, PRIMER é um quebra-cabeças que exige do espectador a máxima atenção, são tantos os detalhes que é necessário ser visto mais de uma vez. E acredite: a cada exibição o filme fica ainda mais interessante.

O OLHAR INVÍSIVEL
(La Mirada Invisible, Argentina, 2010)
Direção:  Diego Lerman
Com ecos de Lucrecia Martel, essa película se passa em 1982, quase que exclusivamente dentro do Colégio Nacional de Buenos Aires, durante os últimos dias da ditadura militar argentina. O microcosmo do colégio reflete, naturalmente, a repressão e rigidez que acometia o país naquela época. Marita, inspetora encarregada de vigiar o cumprimento das severas regras escolares, o olhar invisível do título, e que usa o seu cargo como pretexto para observar os alunos no banheiro, é a típica representante de uma classe média utópica, que em busca de valorização profissional vivia alheia ao regime ditatorial. Feito de breves gestos, de olhares, temos, novamente, outro bom exemplar do cinema argentino, mas afirmar isso é chover no molhado.
 
O ABRIGO
(Take Shelter, EUA, 2011)
Direção: Jeff Nichols
Sempre questiono se os distribuidores brasileiros, tão preocupados com estratégias de mercado, conhecem efetivamente a sétima arte quando vejo um filme como esse estrear diretamente em home vídeo. Espécie de primo-pobre de MELANCOLIA, de Lars von Trier, e A ÁRVORE DA VIDA, de Terrence Malick, O ABRIGO acompanha de perto Curtis, ótima performance de Michael Shannon, um homem dócil, introvertido, pai de família devotado, que tem sua rotina afetada quando a iminência de uma tempestade devastadora, que somente ele consegue observar, escutar e sentir, o leva a construir um abrigo subterrâneo, decisão que terá graves consequências em sua vida. Sem sabermos se essa tempestade é real, ou se compartilhamos dos delírios de Curtis, O ABRIGO possui mais incitações psicológicas do que mera angústia apocalíptica.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

POST MORTEM

Por mais mórbido que possa parecer, antigamente era comum fotografar um ente querido morto (costume que ainda é preservado em algumas localidades). A fotografia "Post Mortem" era a última homenagem prestada ao falecido, principalmente nas famílias mais ricas e tradicionais. Para a produção dos retratos eram criados situações e cenários que simulavam um ato corriqueiro, que parecesse natural, como sentar com as pernas cruzadas, segurar livros ou bebês, abraçar um parente, ou ficar “em pé”, com o auxílio de madeiras por dentro da roupa. Fotos “post mortem” aparecem em um dos melhores momentos do filme OS OUTROS (The Others, 2001). Abaixo, alguns exemplos:
A moça em pé está morta
Garotinha apreensiva ao lado do irmão morto

Pai e filho mortos

sexta-feira, 20 de julho de 2012

DAS COISAS QUE EU ADORO EM BLOGUES

Blogues que são atualizados frequentemente. Blogues que produzem seu próprio conteúdo. Blogues enxutos, com um design que favoreça a leitura. Blogues que respeitam a obra de Caio Fernando Abreu, Cecília Meireles e Clarice Lispector. Blogues que respeitam a Língua Portuguesa. Blogues que publicam todos os comentários. Blogues que não utilizam letras de verificação. Blogues com torrents de filmes independentes. Blogues com EPs de bandas independentes. Blogues que provocam. Blogues que informam. Blogues que apontam caminhos, possibilidades. Blogues que não pareçam diários de adolescente. Blogues que pareçam blogues. Blogues com boa poesia. Blogues que saibam a diferença entre crítica e spoiler. Blogues com listas de “odeio” ou “adoro”. Blogues que não se incomodam com a opinião de outros blogueiros.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

DAS COISAS QUE EU ODEIO EM BLOGUES

Blogues que são abandonados depois da primeira postagem. Blogues desatualizados há mais de um mês. Blogues que parecem Twitter.  Blogues que utilizam todos os gadgets disponíveis. Blogues que não produzem seu próprio conteúdo. Blogues que mudam o design como quem muda de roupa. Playlist (ser obrigado a escutar Céline Dion ou Michael Bublé é tortura). Quem “confunde” blogue com fotolog. Ponteiros animados. Clicar em um link e abrir várias páginas. Fonte cursiva. Comentários CTRL+C CTRL+V (“teu blog é lindo já tô seguindo me segue também”). Selinhos. Plágio. Postagens que citam Caio Fernando Abreu ou Clarice Lispector com frases que nem são deles. Postagens suicidas (“estou sozinho em meu quarto, ninguém me entende, apenas o Mc Lanche me deixa feliz”). Postagens  informando que “estou sem tempo para postar”.  Nova Língua Portuguesa (“nada haver”, “agente vai amanhã”, “ela mim falou” e “eu desistir de comprar” são exemplos). Abreviações. Letras de verificação. “Continue lendo...”. Spoilers. Listas de “odeio” ou “adoro”.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

TODO DIA É DIA DE ROCK

No dia 13 de julho de 1985 acontecia o Live Aid, um show simultâneo em diversas cidades do planeta, com o objetivo de arrecadar fundos contra a fome na Etiópia e com a presença de artistas como The Who, Dire Straits, Queen, David Bowie, BB King, U2, Paul McCartney, Phil Collins, entre outros – desde então, 13 de julho passou a ser conhecido como o Dia Mundial do Rock. Para lembrar essa efeméride, segue a performance de Raul Seixas no Festival Phono 73 (provavelmente sua melhor apresentação ao vivo), com as canções “Let me sing, let me sing” e “Loteria de Babilônia”. Realizado no Centro de Convenções do Anhembi, em São Paulo, de 11 a 13 de Maio de 1973, o festival era uma estratégia de marketing que pretendia demonstrar ao governo militar que a gravadora Phillips/Phonogram (Universal), não era um reduto de comunistas, no entanto o evento ganhou um forte viés político, principalmente quando Chico Buarque e Gilberto Gil tiveram o som dos seus microfones desligados pela polícia durante a  exibição de "Cálice". O festival ainda contou com Elis Regina, Gal Costa, MPB4, Caetano Veloso, Wilson Simonal e Jorge Ben.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

O MESTRE DOS MAGOS

          Ele sempre aparecia quando eu precisava. E desaparecia quando eu precisava mais ainda. Um dia, me vi num inferno, num mato sem cachorro — sem enigma que pudesse quitar os meus pecados.

terça-feira, 3 de julho de 2012

PODERIAM SER CRÔNICAS, MAS SÃO APENAS NOTAS IV

(*) Há várias maneiras de saber que você está ficando velho: quando você começa suas frases com um nostálgico “antigamente...” ou “no meu tempo...”, quando você pede para diminuir o volume ou quando as pessoas ao seu redor passam a perguntar quando você terá um filho, por exemplo – e, ultimamente, esta tem me perseguido. Tenho respostas prontas que utilizo a depender do grau de intimidade que possuo com quem pergunta, falta de talento, incompetência e excesso de juízo são algumas delas. 98,98% dos pais que eu conheço, esses mesmos que me importunam com esse tipo de pergunta, tiveram filhos por “acidente”. Não quero olhar para o meu filho e vê-lo como um acidente, algo que não deveria ter acontecido, sentado no sofá a imaginar que vida eu teria se eu não fosse pai.

(*) Pessoas excessivamente convictas me cansam. Aprecio quem hesita, quem oscila. Pessoas excessivamente convictas batem o pênalti para fora, ficam em xeque a todo instante (um bom jogador não deixa de duvidar). Pessoas excessivamente convictas não são boas de papo, não são boas de copo, não são boas amantes. Pessoas excessivamente convictas têm uma velha opinião formada sobre tudo, sempre.

(*) Tenho amigos que dizem me invejar porque, segundo eles, estou constantemente “ligado” em bandas novas, livros novos, filmes novos, vida nova... Tenho um, especificamente, que diz que sou “viciado em juventude” (sem nenhum cunho pedófilo, assim espero). Outro, afirma que chega um momento da nossa efêmera existência que só é possível ouvir os mesmos discos, reler os mesmos livros, rever os mesmos filmes, ver os novos filmes dos mesmos diretores... Será? Acho o dia muito curto para ficar agonizando no repeat.

(*) Já escutei, algumas vezes, que sou um bom conciliador, que escapo com destreza de polêmicas e transito com desenvoltura em diversos ambientes – há quem me considere, inclusive, um hábil e desperdiçado político. Essa qualidade é exaltada até por pessoas que não me são simpáticas. Na verdade, não sou nada disso, tal qual  o Conselheiro Aires, de Machado de Assis, tenho tédio à controvérsia, somente.

(*) Poderiam ser crônicas, mas são apenas páginas de diário.
Related Posts with Thumbnails