Não sou crítico musical, sou um reles cronista de pequenos posts, o que me permite abordar o show de Caetano Veloso na Concha Acústica em Salvador ontem por qualquer ótica. Poderia dizer que gato e cachorro na cidade pagam meia entrada, o que sempre me deixa a impressão de que estou sendo lesado ou que a centenária matriarca Claudionor Velloso parecia enfadada em seu canto do palco, tirando a mão do queixo somente ao identificar os versos de “Não Identificado”. No entanto, prefiro escrever sobre fantasmas. Diferentemente do que apresentou no começo do ano em Santo Amaro - onde sempre subestima o público presente com um repertório sem novidades pra você e eu e todo mundo cantar junto – ele evitou o aplauso fácil ao cantar onze canções do disco “Zii e Zie” (escutadas silenciosamente pela maior parte da platéia que claramente desconhecia o trabalho, como ficou evidente nos risos involuntários provocados pela letra de “Incompatibilidade de Gênios”). Acompanhado pela ótima Banda Cê, bem mais encorpada do que na última turnê, seus indie-sambas e sua postura eram extremamente rock, principalmente em canções como “Maria Bethânia” e “Eu sou Neguinha” (a melhor do show). Surpreendente para mim apenas a inclusão da cover “Água” de Kassin + 2 e o bis com a tecno-marchinha “Manjar de Reis”. A abertura foi com “A Voz do Morto”, feita especialmente para Aracy de Almeida em 1968 - que não suportava mais ter que carregar o fantasma de Noel Rosa e que injusta e ironicamente é lembrada hoje como a rabugenta jurada do Programa Sílvio Santos. À canção foi incorporado o pegajoso refrão “tem que ser viola” do grupo de pagode baiano Fantasmão, e embora não faça eco às suas teorias exageradas sobre a música carnavalesca feita na Bahia, admito sem a menor culpa que ficou perfeito. Um híbrido inusitado e bem mais interessante que o barzinho e violão de “Mimar Você” da Timbalada, que ele fez em “Noites do Norte” em 2001. No final do show me deparei com os rockers baianos Glauber Guimarães, Fábio Cascadura e Ronei Jorge esperando despretensiosamente por uma oportunidade de falar com o ídolo, talvez que a verdadeira Bahia é o Rio Vermelho. Ao ver Ronei recordei que naquela mesma Concha Acústica em 1999, comandando ainda a extinta banda Saci Tric, ele exibia uma camiseta com a frase Aracy de Almeida is a punk rocker. E ainda teve aquele frevo axé.