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segunda-feira, 22 de agosto de 2016

DESENCONTROS


Mais um poema traduzido para o francês pelo amigo Pedro Vianna


não tenho medo de ser simples
tenho medo de ser oco
de ser raso

não tenho medo do esquecimento
tenho medo da lembrança feita de mágoa
do rancor

não tenho medo da rotina
da crise de meia-idade
da constância dos funerais
das mesmas conversas
dos mesmos amigos

tenho medo do verão
tenho medo da saudade

tenho medo dos caminhos que não segui
das escolhas que não fiz
dos desencontros



Rencontres ratées

je n’ai pas peur d’être simple
j’ai peur d’être creux
d’être plat

je n’ai pas peur de l’oubli
j’ai peur du souvenir fait de chagrin
de la rancœur

je n’ai pas peur de la routine
de la crise de l’âge mûr
de la récurrence des funérailles
des mêmes conversations
des mêmes amis

j’ai peur de l’été
j’ai peur de la présence des absences

j’ai peur des chemins que je n’ai pas suivis
des choix que je n’ai pas faits
des rencontres ratées

Tradução para o francês:
Pedro Vianna



sábado, 21 de maio de 2016

IMPUBLICÁVEL


trago na cabeça
um poema tão doloroso
e injustificável
que jamais tentarei
colocar no papel

costumo cantarolar seus versos
numa melodia tristonha
quando estou sozinho
quando a chuva me apanha
na rua e não procuro abrigo
quando amanhece do outro
lado da minha cortina

esse poema é só meu

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

SOL DE MAIO

gosto das minhas cicatrizes
de quem não me entende
de quem acha que me entende

gosto do meu passado
até quando ele me condena

gosto de quem me intimida
de descer do salto
de andar descalço
de saudar o inverno

gosto dos mitos
dos boatos
dos rumores

gosto da dúvida
da contradição
gosto de versos que começam com “sou”
mas que pouco explicam

gosto do silêncio das capitais
de ser mais um na multidão
mais um retalho na colcha

gosto da fumaça do narguilé
dos florais de bach
dos realejos e teremins

gosto do cinema argentino
do futebol argentino
fito paez
borges

gosto do café dos maestros
e da face serena do sol de maio
(Herculano Neto)

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

EPÍGRAFE



Rosamund Pike
épigraphe

les épigraphes sont parlantes
ne se cachent pas

l’épigraphe c’est toi sous la plume de l’autre
c’est le vers en plein dans le but
la référence
la déférence
la bénédiction

les épigraphes sont traîtresses
décoratives
superflues

les épigraphes sont médisantes
prétentieuses
tendancieuses

les épigraphes sont autosuffisantes
les épigraphes sont des épitaphes


epígrafe
epígrafes dizem mais
não se escondem

a epígrafe é você na pena do outro
é o verso certeiro
a referência
a deferência
a bênção

epígrafes são traiçoeiras
decorativas
desnecessárias

epígrafes são maledicentes
pretensiosas
tendenciosas

epígrafes são autossuficientes
epígrafes são epitáfios


*POEMA INTEGRANTE DE "A CASA DA ÁRVORE"

 




segunda-feira, 11 de agosto de 2014

SINOPSE

Chiara Mastroianni
synopse

je suis fait d’hypothèses :

la plus probable est celle qui
me dément le mieux

la plus cruelle est celle qui m’explique
le mieux

je suis fait d’équivoques
contradictions
convictions
papillons

je suis une bougie allumée
dans la nuit des angoisses




sinopse

sou feito de hipóteses:

a mais provável é a que
melhor me desmente

a mais cruel é a que melhor
me explica

sou feito de equívocos
contradições
convicções
borboletas

sou vela acesa
na noite das angústias


*POEMA INTEGRANTE DE "A CASA DA ÁRVORE"

segunda-feira, 14 de julho de 2014

PORMENORES


 
a infância foi uma manhã
                                de sol


há tempos que sou
noite de rugas e cabelos brancos


a infância passou
sem nuvens


quase madrugada 






*POEMA INTEGRANTE DE "A CASA DA ÁRVORE"

quinta-feira, 12 de junho de 2014

COM DEFEITO DE FÁBRICA

      Nasci com saudade, meu defeito de fábrica. E de saudade estão contaminados os poemas de "A Casa da Árvore". Saudade, inclusive, do que não vivi.
      Sempre fiz poesia, ou deixei que a poesia me fizesse, que moldasse minha escrita, minha necessidade de exteriorizar sentimentos, uma inquietação juvenil que o tempo se encarregou de dizer o que é página de diário, letra de música, poesia ou incinerador. Muitas ideias ficaram pelo caminho, projetos que não foram adiante, poemas que envelheceram mal nas gavetas, que perderam o sentido, que não faziam sentido. O que sobreviveu virou CINEMA, minha primeira publicação solo e atrevimento poético. Naquela época, embora não fosse mais tão menino assim, cultivava algumas pretensões e ansiedades típicas de iniciante, um desejo de querer dizer tudo que eu acreditava ser essencial. Ali, a infância já era um tema que tingia de saudade quase todo o livro.
        Em A CASA DA ÁRVORE reencontro a infância. Só que dessa vez a observo de longe. Dividido em três partes ou três lares (Casa de Retalhos, Casa de Espelhos e A Casa da Árvore), reúne o que produzi de relevante, na minha caótica opinião, nos últimos anos. Pouco escrevo poesia, às vezes passo meses e mais meses sem nada escrever. Ao contrário da minha obra de ficção, que tenho o completo domínio do parar e iniciar, minha poesia é quem me comanda. Parece clichê, provavelmente até seja, mas poesia é de dentro pra fora. Sua feitura é diferente. É dolorosa. Na primeira parte, Casa de Retalhos, trago os poemas postados no meu blogue, com pontuais modificações nos títulos, palavras e até na inclusão, exclusão e ordem dos versos. Desde o início, o plural “retalhos” parecia ser a escolha mais óbvia para designar o capítulo, mas ao ver todos aqueles textos agrupados, notei que havia uma unidade, um desassossego, uma melancolia.  Na revisão final “retalhos” permaneceu. Percebi que na minha memória afetiva “retalhos” sempre foi singular. A segunda parte, Casa dos Espelhos, é a menor e a que mais me deu prazer em produzir, pois pude retomar, com um saudável distanciamento, poemas antigos através das traduções realizadas, e publicadas, pelo amigo Pedro Vianna na França (“Arrumando as Malas”, de OS OUTROS POEMAS DE QUE FALEI, 2004; “Os Outros”, de SOB PRESCRIÇÃO, 2006; “Malícias”, inédito; “Versos Excluídos”, “Sinopse”, “Ironia”, “Um Miserável a ver navios” e “Pano de Boca”, de CINEMA, 2007). A última parte também denomina o livro, A Casa da Árvore, e é uma reflexão sobre a infância, sobre como dói ser criança, sobre como é equivocada a urgência de crescer, embora só percebamos isso depois, muito depois. Nesse capítulo, a saudade inflama com mais intensidade, indo de uma solitária partida de futebol de botão, passando pela casa em que crescemos e que nunca nos abandonará a até um platônico amor infantil que encontrará seu fim nas rodas de um caminhão. O mundo era menos triste/ na casa da árvore. Inevitável sentença.
      A infância não é para inocentes, mas a poesia talvez seja. Então, quero que essa inocência impregne meus versos, quero resvalar na criança que eu fui, quero que ela encontre o adulto que eu me tornei, quero que ela tenha orgulho de mim.
         Nasci com saudade, meu defeito de fábrica. 

segunda-feira, 2 de junho de 2014

AMIGOS EM CASA

A sua palavra comprime tantos mundos que, ao menor gesto compreensivo da sensibilidade, ela "explode" em suas mãos, em seu olhar, em sua consciência. Poeta de versos curtos e emoção intensa, cada imagem nos arrebata, em ritmo que prende a respiração e nos faz soltar um grito.
Jorge Portugal

Temerário e malcriado, ele trafega na contramão, nunca estando onde se espera. E assim surpreende com momentos de veracidade e dor pungente. Sempre dilacerado, Herculano reúne coragem e velhacaria, prosódia barata ou complicada, conforme a conveniência, tudo de caso pensado, desorientando a seu bel prazer. Me espanta o desencanto humanitário desse mestiço do Recôncavo!
Edgard Navarro

Herculano tem chumbo no sangue e isso define sua poesia: tem peso. O mais simples verso carrega toneladas de sentido, "vocação para o abismo / para o abraço". Herculano tem chumbo no sangue e isso define sua alma tal qual o chumbo correndo pelas veias de sua Santo Amaro da Purificação.
 Katherine Funke

Não sei se a árvore da casa era "pé" de cajá, grumixama ou araçá... Só sei que o tempo de sonhar, de rir, de olhar pra trança da menina, de chutar as poças d’água foi quando a criança que morava na casa da árvore queria beijar a garotinha ruiva, navegar pra ilha de Robinson Crusoé e ter um badogue feito com forquilha de goiabeira pra derrubar o sariguê que queria comer os ovos do ninho de sofrê...
Boris Azevedo

Herculano é um fatalizado pelas setas da poesia As sombras do cotidiano assolam suas retinas, que, como negativos de filme, gravam o desaninhar das metáforas escondidas nas sombras do dia: “é tarde/ e todos os clichês estão no lugar”. É impossível sair ileso das veredas que constrói o poeta. 
Georgio Rios

A CASA DA ÁRVORE
Lançamento dia 05 de junho
ICBA - Salvador - BA
A partir das 18 horas
Entrada franca

segunda-feira, 10 de maio de 2010

BATATA-QUENTE

BATATA-QUENTE*
(Herculano Neto)

Trago nos ombros o nome
que meu bisavô deu a meu avô
que meu avô deu a meu pai
que meu pai me deu
e que eu não tenho para quem dar.



*Poema do livro infantil, ainda inédito, A CASA DA ÁRVORE.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

POEMA INÉDITO


o mundo era mais simples
na casa da árvore

não havia antenas
telefone
campainha
portas

pessoas que dizem adeus
mas não vão embora

o mundo era menos triste
na casa da árvore
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