Houve um tempo em que eu tinha desistido de mim, não sabia o que era a luz do dia nem alimento que não fosse bebido, injetado ou aspirado. Quis cair de boca na boca da noite e acabei caindo nos dentes da Boca do Rio. Era requisitado pelos playboys da Pituba, pois constava sempre a massa boa, "a de qualidade". Curtia a noite até a última ponta: suas dores; seus atalhos; seus clichês; suas miragens. Até conhecer Pérola, uma negra de porte altivo e cabelos de nylon, que realizava um trabalho social com as prostitutas e travestis afrodescendentes da orla. Eu era útil para ela porque sabia o ponto e o nome de todas, algumas até o nome de batismo. Cheia de revolta e ideais socialistas, me fascinou seu discurso caduco, suas vestes de princesa africana e sua idolatria por Omolu, "o que mata sem faca". (Pérola era o arco-íris de Madagascar). Seu conceito de igualdade pouco se chocou com meu desencanto humanitário. Foi minha pele parda, de mestiço do Recôncavo, que não combinava com a dela - que me considerava muito branco para o seu universo.
REFERÊNCIAS
- O título do conto é um verso da canção ALEGRIA DA CIDADE (Lazzo/ Jorge Portugal), gravada pela cantora Margareth Menezes em 1988: “A minha pele de ébano é a minha alma nua”;- “Eu sou o arco-íris de Madagascar” é parte da canção MADAGASCAR OLODUM (Rey Zulu), emblemático sucesso da extinta Banda Reflexu’s em 1987;
- Omolu é um orixá africano cultuado nas religiões afrobrasileiras que o tem como o Senhor da Morte. “O que mata sem faca” é um epíteto utilizado pelo escritor João Ubaldo Ribeiro em VIVA O POVO BRASILEIRO, publicado em 1984;
- Boca do Rio e Pituba são bairros, aparentemente, da orla marítima de Salvador;
- O Recôncavo baiano é a região geográfica localizada em torno da Baía de Todos os Santos;
- Modelo da fotografia: não sei;
- Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança terá sido apenas semelhança.
Muito bom.
ResponderExcluirFiquei imaginando o que aconteceria no dia seguinte...rs
Abraços
Se eu te contar que antes de entrar pra polícia eu transitava por movimentos populares de resgate da cidadania de grupos de risco...
ResponderExcluirAcredita?
Experiências marcantes... para o resto da vida.
Gosto demais do seu blog!
Um beijo!
O texto é fascinante, a cara da night de Salvador (no Rio Vermelho principalmente). As referências deram um toque especial, e são bem espirituosas e divertidas (para muitos, necessárias). Para terminar: há racismo em toda parte.
ResponderExcluirA pele pode ser negra, branca, ou amarela...
ResponderExcluirnão importa a cor dela.
O coração é vermelho...se é belo
tem a cor do amor, como o de Pérola.
Grande apelo à reflexão...gostei muito, parabéns!
tenho meio que um preconceito contra microcontos, principalmente aqueles de twitter. mas ando lendo com mais atenção os que me aparecem pelo caminho pra ver se consigo parar com essa implicância. devagar eu chego lá.
ResponderExcluirBelíssimo texto. Este final, então, arrasa. Abraço!
ResponderExcluirHoje em dia um dos piores preconceitos é o preconceito consigo mesmo.
ResponderExcluirÉ estranho alguém se achar mais daquilo ou disso.
Há afrodecendentes que fazem vítimas de seus preconceitos outros afrodescendentes só porque esses são de um padrão de vida melhor. Como se eles por assim serem ão pudessem ter um padrão de vida melhor. É contra a raça.
No país da copa quem sofre o preconceito são os brancos. Vingança? Talvez.
Só sei que preconceito é algo muito complexo pra se dizer que trocando passes de bola ele possa ser tão facilmente extinto - ou contornado.
Meu abraço.
Eu adorei o conto. MUITO!
ResponderExcluirBjs e bom fds
Muito bom!!!
ResponderExcluirNossa, adorei *-*
ResponderExcluirFiquei com vontade de conhece-la, com certeza qualquer um se apaixonaria.
Parabéns pelo texto, você escreve super, super bem.
Muito bom..Vc fez sozinho ??
ResponderExcluirAdorei o seu microconto...
ResponderExcluirbem interessante...
e o final...
ainda mais
Beijos
Leca
Gostei muito do texto. Parece tão real. Seus personagens podem ser encontrados em qualquer esquina da cidade. Parabéns!
ResponderExcluirAndo desencantada com os seres humanos.
ResponderExcluirMuito interessante.
ResponderExcluirGostei da crueza, Humberto.
ResponderExcluirbeijo
o preconceito vencerá o amor?
ResponderExcluirlindo o seu post meu caro!!
Bem me parecia que te tinha chamado Humberto , Herculano....e vá-se lá saber porquê...
ResponderExcluirsorry!
oi menino escritor, bom ver seu blog, bom ler seus textos, bom ter vc por lá tb, obrigada...
ResponderExcluirbj grande viu
o que?
ResponderExcluirCada vez melhor - adoro temas sociológicos.
ResponderExcluirgrande abraço
Muito bem escrito... sensível e verdadeiro...Adorei
ResponderExcluirBjs
Ah meu desencanto humanitário...
ResponderExcluir=/
acho que a minha tá coberta agora.
ResponderExcluirabs
Olá
ResponderExcluirmuito bom este texto.
Um abraço
"Foi minha pele parda, de mestiço do Recôncavo, que não combinava com a dela - que me considerava muito branco para o seu universo."
ResponderExcluirEsse final foi simplesmente incrível. Belíssimo texto!
diferente .. ee gostei (:
ResponderExcluirquando li "acabei caindo nos dentes da Boca do Rio. " pensei que você fosse do RJ, mas é baiano, nordestino! (:
ResponderExcluirgostei do estilo, é meio dissertativo-poético (não sei explicar bem), mas aprovei (:
obrigada pela visita e desculpe a demora pra responder (:
Acho marcante o jeito como escreve. E histórias assim acontecem sempre, não sei se todos os dias, mas acontecem.
ResponderExcluirBeijo grande!
Cada dia gostando mais daqui. ^^
ResponderExcluirA cor da pele, assim como o preconceito, pode se modificar. Tudo depende do ângulo em que olhamos... lindo texto! Beijo.
ResponderExcluirfase obscura q td mundo passa :/
ResponderExcluirEssa semana é a Semana do Meio Ambiente no meu blog.Venha dar uma lida na Programação Verde.
Te espero lá!
www.fluem.blogspot.com
:*
lindo conto
ResponderExcluir=]
Teu blog sempre me inspirou. Grande abraço.
ResponderExcluirsempre acho um eufemismo politicamente correto a palavrinha 'afrodescendente', o "sem" reverbera. E sobre trabalhos comunitários; presto atenção nessa gente que se reúne para 'ajudar' o outro, quando na verdade quem precisa ser ajudado são esses eres tão voluntariosos e o final do seu texto exemplifica isso.
ResponderExcluirMuito Bom! Muito mesmo :D
ResponderExcluiraah, mas o que a quantidade de melanina no corpo de uma pessoa pode significar? Para mim apenas uma cor, nada mais. Mas se olharmos em volta há muitos que julgam pela cor. É triste, hipócrita e cruel, porém real.
Beijos! Te espero lá com suas palavras sábias :D
Muito bom isso fiquei preso nas palavras enquanto lia, e depois nos pensamentos.
ResponderExcluirUm abraço!!!
É na mistura de cores que está a beleza de ser. Lindo! Muito, muito bom!
ResponderExcluirTocante...
ResponderExcluir(Ainda absorvendo tamanha beleza)
Muito bom! e a modelo parece Adil Araújo, dançarina maravilhosa daqui de Salvador. Pode ser?
ResponderExcluirGostei da "pegada". ;)
ResponderExcluirAbraços,
Lou