quinta-feira, 3 de abril de 2025

UMA PLAYLIST PARA O MEU FUNERAL

Sempre escutei, em tom de anedota, que um sinal de que estamos ficando velhos é ir a funerais com frequência – como se fosse necessário sepultar amigos e familiares para confirmar isso. Uma vez que, obviamente, tenho envelhecido, o cemitério passou a ser um local que visito bem mais do que eu imaginava que seria depois dos quarenta, essa república federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus não dá uma trégua. Nas cerimônias de cremação o uso de música faz parte do protocolo, talvez para expressar a personalidade do falecido, uma mera homenagem ou simplesmente para tornar o ambiente e o ritual menos desagradáveis. Não é nem um pouco difícil me imaginar deitado num caixão que vai descendo lentamente até desaparecer dos olhos lacrimosos da audiência. Uma canção que costuma apresentar-se nesse instante é “Naquela Mesa” na voz inadjetivável de Nelson Gonçalves. A canção de Sérgio Bittencourt, composta para seu pai Jacob do Bandolim, é deveras comovente. A imagem de um senhor alegre e contador de histórias é quase palpável. Mas aquele cara na mesa não sou eu. Gosto bastante de música para permitir que em um momento de apreensão o responsável pelos procedimentos do meu funeral responda para o funcionário do crematório: “pode colocar qualquer música”. Espero dar o mínimo de trabalho possível quando eu morrer, deixar tudo pago e até a playlist que vai tocar no modo aleatório durante minha cremação. 


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