quarta-feira, 15 de junho de 2011

SAÚDE

         Estou sempre espirrando. Não sei se é rinite alérgica ou qualquer outro modismo médico, só sei que estou sempre espirrando. São espirros estridentes, secos e sequenciais, geralmente entre oito e dez, que incomodam todos ao meu redor. Ultimamente, com a propagação de informações sobre surtos de gripes e viroses, espirrar em público tornou-se constrangedor. Já tentei todos os  tratamentos existentes, máscaras, homeopatia, infusões, antialérgicos, nebulização e terapias: sem sucesso.
         No último verão, uma curandeira da Chapada Diamantina me receitou uma mistura de ervas que, incrivelmente, fez cessar os espirros. No entanto, parecia que faltava algo em mim. Depois de dois dias parei de usar e voltei aos espirros.
         Espirrar, admito, é um prazer.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

O DIA DOS NAMORADOS DE EDUARDO E MÔNICA

Cindy e Dean
In Memoriam de Bartô,
o surdo-mudo mais falastrão que já conheci
   
         O “Dia dos Namorados” é habilmente aproveitado, e manipulado, pelo mercado (como qualquer outro “dia de...”). Nenhuma novidade. Mas o que agora chamou minha atenção foi a equivocada estratégia de colocar “Blue Valentine” para representar os namorados nas salas dos cinemas em junho, talvez na falta de uma comédia romântica os distribuidores acreditaram que este “Namorados Para Sempre” (título que o filme recebeu por aqui) seria suficiente. No entanto, “para sempre” é tudo que não veremos.
         “Blue Valentine” acompanha os últimos momentos do casamento de Dean (Ryan Gosling) e Cindy (Michelle Williams, que foi indicada ao Oscar de melhor atriz), um pintor de paredes sem emprego fixo e uma enfermeira que dividem a casa simples com a filha de seis anos e um cachorro. Quando o filme começa, nos deparamos com o casal quase no término do relacionamento, são raras as conversas, os poucos gestos de carinho são evitados por ela – que não sabemos, apenas imaginamos, os motivos. O premiado roteiro transita entre o início e o fim da relação, nos privando de conhecer o que aconteceu durante. Os flashbacks não revelam muito, e surgem aleatoriamente. A entrega dos atores permite bons improvisos, como na sequencia em que Ryan canta para Michelle dançar (ela sem saber que música escutaria e ele sem saber que ela realmente sabia sapatear). “Blue Valentine” é o título de uma canção, e de um disco, de Tom Waits, que narra a trajetória de um casal que se apaixona e se desapaixona. O filme é sobre isso. Não é, como nos acostumamos a ver, a descoberta do amor. É o final, ou a aceitação do final. Pode ser um programa depressivo, e reflexivo, para se fazer a dois, mas valerá a pena se a intenção for apreciar um filme sobre pessoas normais e dramas normais.
         (Dean e Cindy não são Eduardo e Mônica).
         Acredito que nesse momento todo mundo já viu (ou já ouviu falar sobre) a campanha do dia dos namorados de uma empresa de telefonia móvel que transporta a canção de Renato Russo para os dias atuais, um mundo onde ninguém pode viver sem telefone celular. Nunca simpatizei muito com música com “historinha”, típica dos anos 80, e “Eduardo e Mônica” menos ainda, soava classe média demais para minha realidade, algo que se confirma ainda mais agora.
         Eu tinha um amigo surdo-mudo que adorava Legião Urbana, gostava dos encartes dos LP's, gostava das letras das canções, mesmo sem nunca ter podido escutar a voz de Renato Russo. Ele não suportava ser tratado com piedade, além de ser genialmente irônico e mordaz, e odiava videoclipes (e ainda há quem diga que videoclipe é música para surdos). Certamente, ele também detestaria essa campanha. Quando alguém diz que não entendeu uma canção, provavelmente esperando que eu a explique, digo: veja o clipe.
         Dean e Cindy não são Eduardo e Mônica, mas nada impede que os Eduardos e as Mônicas da vida real um dia se tornem “Blue Valentine”, num mundo onde as pessoas ainda podem viver sem telefone celular.

sábado, 4 de junho de 2011

PLÁSTICO BOLHA

       Leio várias revistas todo mês, mas não sou assinante de nenhuma. Prefiro comprá-las na banca, gosto da expectativa, da surpresa, de perguntar ao jornaleiro se já chegou, de conferir as novidades juntamente com as manchetes da manhã.
       A única vez que assinei uma revista, a finada SET, cancelei a assinatura com menos de um ano, não havia prazer nenhum naquela “praticidade”.
       Penso de maneira parecida em relação à compra pela internet. Cultivo, ainda, o hábito de frequentar lojas físicas, mas nesse caso a concorrência é desleal: o mercado virtual tem melhores preços, produtos, variedades, raridades. Fui obrigado a me render. No entanto, quando minha compra chega, antes mesmo de conferir se tudo está em perfeito estado e conforme solicitei, passo a estourar o plástico bolha que envolve a mercadoria. 
       Muitos se irritam com aqueles estalos, mas para mim eles têm uma função tranquilizante. São quase melódicos.
       Faço isso desde criança, depois que chegou a velha geladeira.  Fazia pausas entre um espocar e outro, estourava dois seguidos, três, eram minhas canções. 
       Sei que estilistas já utilizam as bolhinhas de ar em suas criações, que celebridades exibem por aí seus biquínis, seus vestidos. Sei, também, que há calendários e outros souvenires e que existem chaveiros que reproduzem infinitamente o “plec, plec”, mas não dá pra comparar com a ansiosa busca pela bolha que restou intacta.
       Alguns hábitos não se perdem.
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