terça-feira, 18 de maio de 2021

SOCIAL DISTANCIAMENTO II

Diários da pandemia ou notas perdidas nas páginas ociosas de uma velha agenda


(Março, 2020)

Saíram os primeiros decretos autorizando o trabalho em home office. O que seria temporário vai se tornando permanente a cada semana de prorrogação. As notícias se atropelam sem nenhum sinal de alento, enquanto um expediente de oito horas se arrasta pelo dia todo. Da varanda, observo a rua e a praça desertas sem seus habituais praticantes de caminhadas, crianças correndo ou cães passeando. Um angustiante e eterno domingo. No elevador o aviso de um caso confirmado no condomínio, o medo do outro só aumenta. Formigamento e dormência nos pés e nas pernas não cessam, mas não quero dar atenção para isso agora. Não agora. Ir ao mercado ou à farmácia requer estratégia de guerrilha: “que pra nós dois sair de casa já é se aventurar”.


        
(Abril, 2020)

Adormecer é praticamente uma vitória. As poucas horas de sono são regadas com sonhos inquietantes que me fazem acordar mais cansado do que quando fui deitar. Em um deles as águas cristalinas de um dilúvio cobrem os prédios vizinhos e rapidamente começam a invadir a varanda do 15º andar. Pego a mão do meu filho e em silêncio aguardamos o inevitável. “Where Is My Mind” do Pixies toca aleatoriamente no despertador. 



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