O apresentador Serginho Groisman, recentemente em seu programa, ao receber um livro de um convidado indagou:
- E além de escrever você faz o quê?
A pergunta não causou estranhamento, soou com naturalidade tanto para a plateia quanto para o entrevistado (que não se constrangeu ao dizer sua formação). No entanto foi o suficiente para afugentar o que ainda me restava de sono. Fiquei a pensar que a pergunta, apesar da aparência, não era corriqueira nem simplista. Era emblemática. Carregava uma série de preconceitos e descasos culturais históricos. Se o convidado fosse um filatelista, adestrador, exorcista, deputado, surfista, luthier, enxadrista, enófilo ou uma celebridade instantânea não haveria nenhum tipo de questionamento. Tudo por aqui é plausível, menos escrever. Num país onde quase não se lê escrever é encarado como um hobby, uma desocupação; é praticamente uma excentricidade. Lamentável que formadores de opinião também tenham essa opinião (melhor que o epíteto do programa fosse “vida conveniente na madrugada”). Escritor no Brasil não é profissão, eu sei - é qualidade.
- E além de escrever você faz o quê?
A pergunta não causou estranhamento, soou com naturalidade tanto para a plateia quanto para o entrevistado (que não se constrangeu ao dizer sua formação). No entanto foi o suficiente para afugentar o que ainda me restava de sono. Fiquei a pensar que a pergunta, apesar da aparência, não era corriqueira nem simplista. Era emblemática. Carregava uma série de preconceitos e descasos culturais históricos. Se o convidado fosse um filatelista, adestrador, exorcista, deputado, surfista, luthier, enxadrista, enófilo ou uma celebridade instantânea não haveria nenhum tipo de questionamento. Tudo por aqui é plausível, menos escrever. Num país onde quase não se lê escrever é encarado como um hobby, uma desocupação; é praticamente uma excentricidade. Lamentável que formadores de opinião também tenham essa opinião (melhor que o epíteto do programa fosse “vida conveniente na madrugada”). Escritor no Brasil não é profissão, eu sei - é qualidade.
(Publicado no jornal A TARDE, Salvador_Ba, edição nº 33.275, ano 98, de 16/05/2010)
"Qualidade". Acaba por ser isso mesmo. Gostei dessa. Hoje em dia no Brasil não há espaço para ser somente escritor e quem consegue "apenas" ser isso deve se considerar alguém de sorte, mesmo que qualquer reconhecimento seja por merecimento. Abraço.
ResponderExcluiro mais bizarro que é cargos políticos não deveriam ser visto como profissão. mas vê se ele pergunta a profissão de um vereador, deputado ou senador?
ResponderExcluirTriste isso, Herculano. Aqui, novelas e reality shows têm mais valor do que livros...
ResponderExcluirTem um selo para ti lá no meu blog:
http://tantosdias.blogspot.com/2010/05/selo-vii.html
Abraço.
Olá! Vim agradecer e retribuir a visita. Você tem toda razão, ser escritor no Brasil não é fácil, sobreviver sendo escritor então, nem se fala. Isso mostra a realidade do nosso país,que valoriza um besteirol como o BBB, por exemplo, e simplesmente desmoraliza o escritor, como se escrever vc algo irrelevante e sem importância.
ResponderExcluirOutro dia ouvi algo semelhante.
ResponderExcluirA recomendação que ouvi foi: Que façam algo 'rentável', porque escrever TAMBÉM é produzir - mas não é rentável...
Pensei: Melhor ouvir isto que ser surda...
Mas o teu texto é um outdoor.
Uma esperança? Que leiam muito e leiam mais neste País!
abraços, Herculano.
P.S.
Tomara que o apresentador leia teu artigo e te convide para uma entrevista...
ontem fui fazer uma prova de concurso para trabalhar num banco. De início tive que reescrever(coercitivamente) a frase "A liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem!" Depois me deparei com uma questão acerca dos valores morais e a ética. Fica complicado para alguém que se considera 'para além do bem e do mal' discorrer sobre o tema tendo como expressão de todo o pensamento uma bolinha preta à pintar na folha de respostas. À esta altura, Kafka em uma carteira vazia já estava morrendo de tanto rir da minha cara, dizia ele:"_Vejam só, um poeta que queria trabalhar em um banco!" Já Nietzsche me abandonou antes que a prova acabasse.
ResponderExcluirGostei do teu espaço aqui, suscita boas divagações!vou seguir. Abraço!
Herculano, fui aluna durante um ano de um escritor de romances aqui do sul: Luis Antonio de Assis Brasil. Ele tem dentro da PUC-RS, no programa de pós-graduação do Instituto de Letras e Artes, uma oficina anual para 15 contistas, tem há muitos anos. A minha foi a 23 e isso foi há dez anos. Mas o ponto é que lembro dele falando que, na época, já com 14 livros publicados, dois transformados em filmes, que ainda tinha gente perguntando a ele em que mesmo que ele trabalhava, como se escrever fosse um hobby de gente inútil. Ou seja, o país é uma porcaria mesmo. Cultura aqui é só show de rebolado e lágrima de novela. Se passar para a arte, perde a graça e o público, que, definitivamente, não merece mais os talentos que aqui nascem.
ResponderExcluirSoco na boca do estômago - diz o prof. Paulo Ghiraldelli Jr, que Filosofia é desbanalizar o banal [fizeste isso muito bem]... a pergunta soou banal a todos os ouvidos, platéria, apresentador e mesmo entrevistado, mas não aos seus... outro dia li reportagem de André Vianco falando do quão difícil é viver de escrever no Brasil... :/
ResponderExcluirCara, o que espera de um pais que não tem cidadãos?
ResponderExcluirFique com Deus, menino Herculano.
Um abraço.
eis a lógica capitalista: produzir=lucro. abraço
ResponderExcluirCaro amigo Herculano,certeiro, este é um ponto crucial,fruto da falta de informação, educação e cultura, triste partir de alguém como o apresentador citado.
ResponderExcluirA poesia é uma entidade viva.A poesia é uma entidade desdenhada, assim como os poetas...
Ainda acontece muito isto e só mesmo a poesia será capaz de mudar esta visão, vamos em frente, abraço.
Leio seu texto e me compadeço dessa desumanização pelo escritor. E eu que ousei ser poeta, ja ouvi tantas vezes....Por que não escreves outra coisa? Poesia ninguem compra! :(
ResponderExcluirfoda essas coisas. mas não me espanta não, ainda mais de quem veio.
ResponderExcluirabs
Pergunta trivial e incômoda: por que produzir cultura (e viver disso) parece tão ilógico aos demais? Será que produzir algo que mexa com os sentidos e conceitos (nem sempre de forma comercialmente viável) será sempre uma "brincadeira"?
ResponderExcluirÀs vezes penso nisso (o que me preocupa muito), mas acho que sou teimoso o bastante pra continuar produzindo arte e ver no que vai dar!
num país cheio de riquezas culturais mas que insiste em se menosprezar e se achar sem cultura, sem identidade, sem raízes e voz, escritor é profissão de "desocupado"... triste.
ResponderExcluirSerá que o Serginho não fez a pergunta porque, no Brasil, é difícil para um escritor sobreviver da escrita? Prefiro acreditar que uma pessoa de boas opiniões, como ele tantas vezes se mostrou, acredite que ser escritor não seja uma profissão como as outras. Sabemos quais as preferências de nosso povo, e sabemos que o hábito de ler acompanha poucos, o que muitas vezes não permite que quem escreve sobreviva apenas da venda de seus livros e da repercussão dos mesmos.
ResponderExcluirEnfim... minha opinião.
Abraço, poeta!
Aconteceu parecido com um conhecido meu. Ele é artista plástico, reconhecido, pinta lindamente, mas teve que ouvir algo do tipo: sim, e fora pintar, você faz o que?
ResponderExcluirEntão, te digo, não é só escrever que é qualidade, é se expressar, é criar, é produzir sem pensar em vender depois, apenas para o deleite de quem possa apreciar.
Beijos
Outro dia, num consultório médico, a atendente perguntou em voz alta a profissão do cidadão. Ele respondeu "jornalista". As pessoas já estranharam. Fiquei imaginando se ele dissesse "escritor". Certamente não seria levado a sério.
ResponderExcluirEngraçado, ontem mesmo estava conversando sobre isso com uma amiga. Acho que o escritor não se difere muito do pedreiro, por exemplo. Construir, desconstruir...trabalho árduo esse.
Ótimo post.
Muito bom o texto algo assim direto de direita, na cara desses formadores de opinião, que nem sabem o que diz, assim como aqueles que os assistem, que tenho certeza nem perceberam o cometário!
ResponderExcluirBeijooO'
cara, acho mais emblemático ainda que o Serginho, muito provavelmente, nem tenha falado por mal. Não houve intenção de desqualificar. E isso é pior ainda, pois entra no âmbito do que é naturalizado (veja que não há estranhamento de ninguém). Surreal, de fato. Exemplo de como a leitura é tratada em nosso país, culturalmente. Onde escrever, como está dito, é algo excêntrico. Façamos algo!
ResponderExcluir"Vida inteligente na madrugada"??
ResponderExcluirCoisas do Brasil.
Salvo meia dúzia de afortunados, o escritor exerce a sua profissão por"amor à camisola"...Abraço!
ResponderExcluirSó acho que o que ele disse pode ter dois lados e que, quem fez o texto pode simplesmente ter pego o que entendeu e assumido uma posição de defesa ao que considera.[ao que entendeu]
ResponderExcluiralém poderia ser simplesmente algo a mais, como um escritor não pode andar de skate, surfar, tocar violão?
Talvez o Sérgio tenha se expressado muito mal e não tenha atingido seu objetivo, ou ainda tenha sido esse mesmo o pensamento dele, que caminha rumo a um preconceito.
Mas Preconceito ou não à parte:
Cara, você escreve poemas ótimos, faz algum tempo que não me deparava com algo de tamanha qualidade aqui pela internet.
Vou correndo na livraria pedir um livro teu, acho em qualquer uma?
[ou tenho que comprar contigo?]
Parabéns, paz!
Herculano:
ResponderExcluirO Assis Freitas disse uma coisa importante no comentário dele:
é a lógica capitalista ou neo-liberal : produzir=lucro.
e olhe que isso não acontece só aí, infelizmente.
e, eu não vejo que a nova geração mude isso. pelo menos por cá.
beijo
Herculano,
ResponderExcluirSó mesmo fazendo de conta que o tarde é cedo, porque o agora ainda vale e há-de sempre valer uma parceria ímpar de Herculano Neto e Roberto Mendes, ainda que os Serginhos Groisman da Grobo não auscultem bem...
Abraço mineiro,
Pedro Ramúcio.
Sim...
ResponderExcluirÉ qualidade, adjetivo, substantivo..
Até falta de concordância verbal é...
Mas profissal... Nunca! :~
~*
Aproveitando, meu blog "O Óbvio Utópico" está concorrendo ao Prêmio "The Best GB 2010", realizado pela Gazeta dos Blogueiros, se não for incômodo, você poderia dar o seu voto? Segue o link: http://migre.me/Fox0
Obrigada! *_*
http://o-obvio-utopico.blogspot.com/
nao faz mto tempo q o jornalismo tbm era visto assim, como um hobby =/ (sou estudante de jornal rsrsrssr)
ResponderExcluirTens toda razão meu caro. Triste uma coisa dessas, principalmente para nós que prezamos não somente a boa leitura, mas também a boa escrita.
ResponderExcluirMedonho também é ver um cara como o Serginho se render descaradamente para o "esquema" ao se tornar Global. Talvez tenha apenas servido para mostrar a verdadeira face da figura. Absolutamente boçal.
No mais, bem legal por aqui.
Abraço de arte.
Qualidade que pode tornar profissão, e se escrever por si só for/fosse SÓ qualidade é a qualidade mais tocante e sincera que eu conheço.
ResponderExcluirBeijos :*
Sabe, justamente essa semana eu me peguei pensando nisso. Realmente, escrever no nosso país parece ser bem menos importante que qualquer outra profissão, é como se fosse uma profissão-apoio. E isso é pior ainda pra quem vai prestar vestibular esse ano. Pra quem gosta de escrever, tem Jornalismo (que inclusive já teve toda uma polêmica esse ano) e Letras. Mas fazer Letras no nosso país é ainda mais complicado. Acho que se eu chegar pra a minha mãe e disser: Mãe, vou fazer Letras! Ela vai me chamar de maluca. Tenho mãe, avô e tio professores em casa, fui criada em meio aos livros, e mesmo assim, nenhum deles quer que eu faça Letras. Justamente porque, fazer Letras aqui é ser professor, e convenhamos, professor no nosso país SOOOFRE. Então, se não é Jornalismo, também não é Letras, fico aqui me perguntando o que fazer e que profissão seguir. Meu ano de vestibular está sendo bem mais tenso do que achei que seria!rs
ResponderExcluirNossa, desabafei legal!
Um prazer comentar no seu blog, viu?! Virei sempre aqui.
Beijos, ótima semana. :)
É meu caro Herculano,é assim mesmo.
ResponderExcluirAs pessoas não lêem e a escrita é apenas um hobby para alguns.
Triste essa vida,aliás essa "cultura" brasileira.
:*
Serginho Bostaman?
ResponderExcluirQuem é este cara?
Não o conheço.
Abraço forte, conterrâneo.
Continuemos...
nossa que Zé mané. escrever dá um trabalhão. vc tem que ler muito, pesquisar o dobro e raciocinar o triplo.
ResponderExcluirInfelizmente, qualidade de poucos!
ResponderExcluirA D O R E I a crítica.
ResponderExcluirParabéns.
A escrita faz parte da Alma ardente por isso é muito mais que uma profissão o executar o esvoaçar das letras
ResponderExcluirBom, acho que a pergunta do Serginho não veio por 'maldade' mas sim porque no Brasil é muito difícil viver só do que se escreve, se o escritor não for de certa forma "famoso" ele precisa fazer alguma outra coisa para sobreviver ou no mínimo ser rico. Deveríamos mesmo dar mais valor a escrita, porque ninguém sabe o quanto é difícil traduzir palavras sem a ajuda de um dicionário, e só os escritores fazem isso!
ResponderExcluirAdorei seu blog, gostei dos temas discutidos aqui... Virei mais vezes!
Beijos e obrigada pela passagem no meu.
Reflexão tão importante quanto imbecil. Fico aqui a refletir e a me punir pela necessidade de discutir questões tão impróprias.
ResponderExcluirGentileza, admirado escritor por profissão e escolha, continue a nadar...
Grata pela visita, Herculano! Seja bem vindo ao 'Picante pero Sabrosa'!
Escrevo por hobby e tenho muita dificuldade em me dizer 'escritora' pois me sinto traindo a sua classe profissional. Entende? Não. Escrevo, mas não sou escritora. Escritor é o Herculano Neto. Parabéns!
Garanto que se fosse Paulo Coelho ninguém iria perguntar o que mais ele faz.
ResponderExcluirPena não termos nos encontrado lá no lançamento de KB.
De fato, ser escritor não tem o reconhecimento que deveria ter. Mas concordo com Noe, quando diz que é muito difícil sobreviver apenas como escritor no nosso país, onde pouco se lê.
ResponderExcluiradorei o blog, visitarei mais vezes ;*
Li o comentário primeiro no jornal, só bem depois fui ver aqui.
ResponderExcluirVou na mesma linha de pensamento que Álvaro Andrade, o apresentador só fez uma pergunta que é natural dentro da realidade que vivemos. A dificuldade para publicar e distribuir, a grana que é minguada.
Só acho que Serginho Groisman perdeu a oportunidade de conduzir o papo na direção dos problemas que um escritor encontra para desenvolver sua atividade.
Abraço
Grata pela visita...Me apaixonei primeiro pelo seu nome, pois sou uma das maiores admiradores de Herculano J. Pires. Logo resolvi passar pela tua casa, e que legal essa musica, heim...
ResponderExcluirEle poderia responder que "além de escrever", visita programas de apresentadores malas!
ResponderExcluir"Tudo por aqui é plausível, menos escrever. Num país onde quase não se lê escrever é encarado como um hobby, uma desocupação; é praticamente uma excentricidade."
ResponderExcluirDepois disso, vou dizer o que?
Tá certíssimo.
vai entender neh? mas é claro que entendemos ... estamos no Brasil com seus personagens tupiniquins ...
ResponderExcluirbjux
;-)
Convenhamos que esse slogan "Vida inteligente na madrugada" é um dos mais cínicos da tv brasileira. Infelizmente Altas Horas volta já!
ResponderExcluirUauuuuu!!!!
ResponderExcluirOnde estava você que eu ainda não conhecia seu blog?!!!
Sem dúvida um dos melhores que já visitei nessa minha extasiante vida de 'blogueira', que não deixa de ser um eufemismo atualmente para escritor, não é mesmo?
SALVE O MARAVILHOSO MUNDO DOS BLOGS QUE É A MÍDIA MAIS SIMPLES E DIRETA QUE UM ESCRITOR NOVATO POSSUI ACESSO ATUALMENTE, UMA VEZ QUE AS EDITORAS PREFEREM LANÇAR COLETÂNEAS DE ESCRITORES JÁ CONSAGRADOS A BANCAR O LANÇAMENTO DE NOVOS ESCRITORES, MESMO ELES SENDO TÃO BONS COMO VOCÊ.
SÃO OS 'BUSINESS', FAZER O QUÊ?!!!
CHORAR? NÃO; ACHO MELHOR ESCREVER...
FIRME AÍ, COMPANHEIRO, QUE A LUTA CONTINUA....
BEIJO!!!
Lamento dizer, mas isso é mesmo assim, O Brasil ainda ñ sabe o que é o universo intelectual, vivem em um mundinho medíocre onde as pessoas gostam muito é de ver Pânico, Zorra total,novelas..., ñ conhecem o prazer que uma boa leitura nos proporciona. Beijos.
ResponderExcluirNão se preocupe você não está só, nós músicos também sofremos as mesmas perguntas..
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