quarta-feira, 25 de junho de 2014

O INFAME DA VILEZA

Escritores tendem a se achar semideuses, a única Pepsi-Cola do Jardim de Alah, o pote de ouro no final do arco-íris (muitas vezes se acham o próprio arco-íris) mesmo quando não publicaram nenhuma nota de rodapé, mas isso é o que menos importa, para um escritor é comum acreditar que um dia serão descobertos, compreendidos, cultuados; serão figurinhas fáceis em feiras literárias, terão trechos recitados por Tony Ramos no Fantástico, obras adaptadas para cinema e TV, darão opinião sobre-tudo-e-qualquer-coisa mais do que Caetano Veloso. E se a vida, essa pequenez divina, não os contemplar a tempo, restará a posteridade póstuma, quando serão estudados pelas melhores faculdades, pelas mais brilhantes cabeças pensantes do futuro. Outra característica do escritor é desmerecer o trabalho alheio: só ele escreve bem, o resto chafurda na mediocridade, e quando o colega é realmente bom não passa de um copiador barato, um repetidor de cânones consagrados. Resumindo, escritor no Brasil é um chato de galochas. Sempre que me acho melhor do que realmente sou, abandono minha Bic e vou secar a louça, repor a despensa, limpar os armários: genialidades de pessoas comuns.

23 comentários:

  1. Por isso mesmo, mantenho minha vassoura sempre à postos. Nada como varrer o chão, lavar a louça, limpar o jardim e os banheiros para me lembrar de quem eu realmente sou.
    Texto impecável!
    Adorei esse trecho que fala dos que se acham sempre plagiados, copiados, invejados... ah, meu Deus.

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    1. Nada como arejar a casa antes de partir para a caneta a e papel.

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  2. Muito bom mesmo!
    Vim pela indicação da Ana, e amei a recepção, parabéns!
    Abraço.

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  3. Dizem que me expresso bem, que escrevo bem. Talvez até tenha sonhado em ser escritora, mas hoje, depois de tanto viver e ganhar e perder, penso que seria bom escrever, mas como uma catarse, algo para me reconciliar com minhas perdas. A morte recente de um amigo me fez querer escrever uma ficção "baseada em fatos reais", agora se isso terá algum valor literário já são outros 500.
    Boa sorte.
    Abs,
    Neusa

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  4. Há de tudo, não? Escrevo porque escrevo. Sem desejo de ser publicada, ao menos por enquanto. Ao menos até saber por que ser publicada. Mas gosto de novos livros, lançamentos, autores novos e bons. Ganho, compro, leio, sento e viajo...Mandar e-mail procê hoje, antes que a casa caia e não ache mais nenhum. Bjos

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  5. genial.

    realmente essas pequenezas nos passam pela cabeça, e feliz daquele que escreve e sabe apreciar o que é escrito, independente da mão que manipulou a pena...

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  6. Acho que existe aí também um grande inimigo do escritor: ele mesmo! A autocensura e aquela obrigação besta de que um texto novo deve sempre superar o próximo - até porque ninguém amanhece regado a inspiração todos os dias, não é mesmo?
    Mas preciso confessar que sim, imagino muito meus textos sendo citados por gente importante e formadora de opinião e que tenho um desejo imenso de estar por este plano pra ver isso acontecer.
    Quem sabe...
    Enquanto isso, vou seguir sua sugestão, Herculano, e investir nessas genialidades do nosso dia a dia toda vez que eu estiver aí achando que sou grande coisa.

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    1. Transpiração mais do que inspiração deve sempre moldar o texto.

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    2. Ouvi dizer que a proporção é 90% contra 10%. E um exercício constante, certo?

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  7. Simplesmente apaixonante! Encantado com cada texto que posta aqui, conhecendo ainda, aos poucos, mas curtindo muito ;)

    Grande abraço e um ótimo final de semana!

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  8. Autor desmerecendo o trabalho do outro é o que há de mais medíocre, visto que, tendo se tornado autor, certamente sofreu influências literárias de outros autores. Já tive inúmeras inspirações secando a louça. Atitude sábia e válida! Um abraço!

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  9. Hahaha Você tem total razão, é uma selva de "intelectuais", "pensadores", "incompreendidos" que se isolam em suas supostas genialidades escritas.

    Se há uma coisa que aprendi com as merdas da vida é manter as expectativas sempre baixas sobre tudo e todos. Eu estendo essa lógica para o que escrevo. Por outro lado, seria hipócrita da minha parte e até arrogância, afirmar que não ligo para o que pensam dos meus textos, criticas e elogios de pessoas que entendem do assunto sempre são bem-vindos e procuro melhorar com base neles para que eu consiga, ao menos, viver disso.

    http://omundoemcenas.blogspot.com.br/

    Abraço

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  10. Sempre tive uma imagem: de que a maioria dos escritores nunca ficam satisfeitos com sua obra.Imagino que depois da obra concluida pensem: Poderia ser melhor :) Tenha um bom fim de semana.

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  11. hahaha morri, isso tudo é verdade, mas eu fico alternando entre amar o que escrevo e odiar com todas as forças rs.

    meu blog ♥

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  12. O dilema do escritor: ser ou não ser lido? Quem escreve tem, sim, a vontade de ser lido, mesmo que seja lido apenas por si mesmo (e por isso às vezes escrevemos diários, cadernos secretos de poesia etc.).
    A questão é: será que o escritor quer ser lido pelos outros? Quando outros escrutinam sua obra, ela deixa de ser sua e você está sujeito tanto a críticas que acalentam seu ego quanto críticas capazes de convencê-lo de sua baixa qualidade literária.
    Aí começa a história, se o leitor o considerou ruim, problema do leitor, que não é culto, não tem "referências". Se o leitor o considerou bom, é isso aí, sou bom mesmo, o cara só está repetindo algo que eu já sabia.
    Afinal, para que escrever?
    Acho que não vale a pena (ou não faz bem) escrever só pelo reconhecimento dos outros. Escrever para se sentir uma celebridade de rede social é ser bem raso, mas se o sujeito quer isso...
    Gosto de você ser um cara que escreve porque escreve e pronto, sem essa mitificação em torno da própria figura que a gente vê tanto por aí.
    Beijos, Herculano!

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  13. A impressão que tenho sobre os escritores é que eles não se realizam após cada obra sua, fica sempre a impressão de 'poderia ter feito melhor', 'eu não estava em um bom momento', e blá blá blá...sinto necessidade de vomitar o meu tédio. Tudo de bom!!!!

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