quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

DESCONSTRUINDO RUBEM FONSECA

(Fragmentos desordenados do conto Pierrô da Caverna, 1979)


Um vento forte soprava do mar;
eram cinco horas da tarde
de uma sexta-feira da paixão. Só isso



“Existem pessoas que não se entregam à paixão, sua apatia as leva a escolher uma vida de rotina, onde vegetam como ‘abacaxis numa estufa’, como dizia meu pai. Quanto a mim, o que me mantém vivo é o risco iminente da paixão e seus coadjuvantes, amor, ódio, gozo, misericórdia. Perguntou se eu estava escrevendo alguma coisa. Essa é uma pergunta que vivem nos fazendo, a nós escritores, como se não parássemos nunca de escrever; nós paramos, e às vezes damos um tiro na cabeça por causa disso. Eu nunca seria capaz de escrever sobre acontecimentos reais da minha vida, não só porque ela, como aliás a de quase todos os escritores, nada tem de extraordinário ou interessante, mas também porque eu me sinto mal só de pensar que alguém possa conhecer a minha intimidade. É claro que eu poderia camuflar os fatos com uma aparência de ficção, passando da primeira para a terceira pessoa, acrescentando um pouco de drama e comédia inventados etc. É isso o que muitos escritores fazem e talvez seja a razão pela qual a literatura deles é tão fastidiosa. Querer produzir as belas letras é tão ruim quanto querer ser coerente. Eu sou diferente a cada semana, a cada dia, sou contraditório, bruto e delicado, cruel e generoso, compreensivo e impiedoso. Para falar a verdade eu não sou um cínico, não sei ser irônico, sarcástico, sou tímido e orgulhoso, mas meu orgulho não tem arrogância nem ostentação, apenas auto-estima”.

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